SALMO 15
Os rabinos ensinavam que havia 613 mandamentos que o povo judeu deveria obedecer, a fim de ser justo, mas esse salmo reduz o total de mandamentos para onze. Isaías 33:15,16 apresenta seis requisitos, e Miqueias 6:8 fala de três. Habacuque 2:4 cita apenas um - a fé -, pois a fé em Cristo é o único caminho para o perdão dos pecados e o acesso à presença do Senhor (Jo 14:6; Rm 1:7; Cl 3:11; Hb 10:38). O salmo não diz coisa alguma sobre a oferta de sacrifícios, pois os israelitas espirituais sabiam que a salvação se dava em função de sua fé pessoal (Mc 12:28-34).
É importante observar que o Salmo 15 não é uma prescrição para ser salvo, mas uma descrição de como as pessoas salvas devem viver a fim de agradar a Deus e ter comunhão com ele. Por meio de orações afirmativas e negativas, a lista apresenta várias qualidades que devem estar presentes em todas as áreas da vida em todo o tempo. Os cristãos que desejam ter comunhão profunda com Deus devem seguir o exemplo de Davi e preencher três requisitos pessoais
1. BUSCAR A PRESENÇA DE DEUS (Sl 15:1) Depois que seus homens tomaram o monte Sião, Davi o transformou no local de sua residência e no santuário de Deus, e Jerusalém tornou-se a "Cidade de Davi" (2 Sm 5:1-16). O tabernáculo, o trono e o "santo monte" deveriam ficar juntos (ver 24:3-6; 2:6; 3:4; 43:3). Para o cristão de hoje, o monte Sião refere-se à cidade celestial, onde o povo de Deus habitará para sempre (Hb 12:19-25). Davi fez essa pergunta porque amava a casa do Senhor (26:8; 27:3-5; 65:4) e desejava, de todo coração, conhecer melhor a Deus e ter uma comunhão mais profunda com ele. Os sacerdotes tinham livre acesso à casa do Senhor, mas, apesar de ser rei, Davi não possuía esse mesmo privilégio. O verbo "habitar" quer dizer: "permanecer temporariamente como um estrangeiro", enquanto "morar" refere-se a viver em caráter permanente num determinado local; porém, nesse caso, é bem provável que os verbos sejam sinônimos. Uma vez que conhecia a hospitalidade do Oriente, Davi sabia dos benefícios de morar na casa do Senhor - desejava desfrutar comunhão com Deus e receber a proteção e provisão do Senhor. No hebraico, o termo "morar" é shakan e dá origem à palavra shekineh, que se refere à presença (habitação) da glória de Deus no santuário (Êx 25:8; ver também 29:46; 1 Cr 22:19; Sl 20:2; 78:69; 1 50:1). O maior desejo de Davi é estar com Deus no céu e habitar em sua casa para sempre (23:6; 61:4), pois Deus é nosso lar eterno (90:1). Os cristãos de hoje podem desfrutar a comunhão íntima com Deus por meio de Jesus Cristo (Jo 14:19-31; Hb 10:19-25).
2.OBEDECER A OS PRECEITOS DE DEUS (Sl 15:2-5a)
O versículo 2 cita três áreas fundamentais da vida - um caráter irrepreensível, uma conduta reta e palavras verdadeiras - aplicadas de modo prático e específico nos versículos 3 a 5a. Tendo essas três virtudes básicas, procuraremos desenvolvê-las em todas as áreas de nossa vida e seremos obedientes ao Senhor. Os verbos "viver, praticar e falar" encontram-se no presente do indicativo, mostrando que o cristão devoto obedece ao Senhor a todo tempo e sempre procura lhe agradar.
Integridade - um caráter irrepreensível (w. 2a, 4a, 4b). Aquilo que somos determina, em grande parte, aquilo que fazemos e dizemos, de modo que a primeira ênfase é sobre o caráter piedoso (ver Is 33:14-16; 58:1-12; Jr 7:1-7; Ez 18:5-9; Os 6:6; Mq 6:6- 8; Mt 5:1-1 6). Ser "irrepreensível" não significa ser "impecável", pois não há pessoa alguma na terra sem pecado. O caráter irrepreensível diz respeito a sua solidez, integridade e lealdade total a Deus. Noé era irrepreensível (Gn 6:9), e Deus admoestou Abraão a ser "perfeito" (Gn 17:1), ou seja, dedicado inteiramente ao Senhor (ver 18:13, 23-25; 101:2, 6; Dt 18:9-13; Lc 16:13). Quem possui integridade honra os que também são íntegros e que temem ao Senhor (15:4; 119:63). Não é enganado por bajuladores (12:2, 3) nem seduzido pelos depravados (1:1). Quando pessoas piedosas apoiam as palavras e atos dos ímpios, trazem confusão para a igreja. "Como fonte que foi turvada e manancial corrupto, assim é o justo que cede ao perverso" (Pv 25:26).
Honestidade - uma conduta justa (w. 2b, 5a, 5b). As pessoas que "praticam a justiça" são honestas em tudo o que fazem e desejam que se faça justiça na terra. Na monarquia israelita da Antiguidade, não havia muita coisa que um cidadão comum pudesse fazer sobre juízes corruptos e problemas de extorsão (Ec 3:16, 17; 4:1-3), mas nas democracias de hoje, pelo menos cada cidadão tem um voto. Alguém definiu "política" como "a administração dos assuntos públicos visando o proveito privado" e, com muita frequência, esse é o caso. No versículo 5, Davi aplicou o princípio da honestidade a duas áreas: a cobrança de juros exorbitantes e o recebimento de subornos. Essas duas práticas eram pecados comuns no tempo do reino dividido, e os profetas pregaram contra ambas (Is 1:23; 5:23; 10:2; Ez 22:12; Am 5:11, 12). O povo de Israel não tinha permissão de cobrar juros dos seus compatriotas (Êx 22:25; 23:7, 8; Lv 25:35-38; Dt 23:20), e os juízes haviam sido advertidos a não aceitar subornos (Êx 23:8; Dt 10:17, 18; 27:25; 2 Cr 19:5-7). Não é possível haver justiça numa terra onde o dinheiro diz aos tribunais o que é certo ou errado.
Sinceridade - palavras verdadeiras (w. 2c, 3, 4c). A verdade é o amálgama que mantém a sociedade unida. Se as pessoas conseguem escapar incólumes a suas mentiras, então toda a promessa, acordo, juramento, compromisso e contrato perde imediatamente sua validade. O falso testemunho transforma um julgamento numa farsa e provoca o sofrimento dos inocentes. Porém, devemos dizer a verdade em amor (Ef 4:15) e usá-la como instrumento para construir relacionamentos e também como arma para lutar contra a dissimulação. Quando a verdade encontra-se no coração, os lábios não proferem mentiras, não espalham fofocas (Lv 19:16) nem atacam os inocentes. As pessoas com um coração sincero guardam os seus votos e cumprem as suas promessas (Dt 23:22- 24; Ec 5:1-5). Os íntegros não precisam usar de juramentos para dar peso a suas palavras. Um simples sim ou não serve para comprovar a sua veracidade (Mt 5:33-37). A maioria dos problemas em família, entre vizinhos, no escritório e na igreja decorre de fofocas e de mentiras propagadas pelos que se dedicam a manter os mexericos sempre em circulação. O Senhor deseja que o nosso ser mais interior seja repleto de verdade (51:6) e que amemos e guardemos a verdade.
O Senhor é irrepreensível em seu caráter (1 Jo 1:6), justo em seus atos (Ed 9:15) e verdadeiro em suas palavras (1 Sm 15:29); e ele deseja que os hóspedes em sua casa tenham essas mesmas características.
3. CONFIAR NA PROMESSA DE DEUS (Sl 15:5c )
"Quem deste modo procede não será jamais abalado." Isso significa que os justos descritos no salmo têm segurança e estabilidade em sua vida e não precisam temer terremotos nem ordens de despejo. O termo "abalado" vem de uma palavra hebraica que se refere a um tremor violento (46:3, 4; 82:5; 93:1; 96:10; Is 24:18-20). Deus promete que os justos não precisam temer, pois estão firmemente fundamentados nas promessas de sua aliança. "Aquele, porém, que faz a vontade de Deus permanece eternamente" (1 Jo 2:17). Nestes últimos tempos, Deus está fazendo o mundo estremecer, a fim de que os fiéis permaneçam e os infiéis sejam expostos (Hb 12:18-29). Jesus encerra o Sermão do Monte com uma parábola sobre dois construtores (Mt 7:24-27) cujos edifícios (vidas) foram testados pela tempestade do julgamento. Somente uma dessas estruturas permaneceu firme - a vida da pessoa que fez a vontade de Deus. A vida de piedade sobre a qual Jesus fala no Sermão do Monte é paralela às características da pessoa piedosa descrita no Salmo 1 5,14 e, nas duas passagens, encontramos a promessa: "Quem deste modo procede não será jamais abalado".
Pr. W. Wiersbe